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A Casa do desperdício

Por Lucas Lyra

 

Severa crise orçamentária, absoluto caos em praticamente todos os serviços prestados pelo Estado, protestos irrompendo por todo o país. “Vamos cortar da própria carne”, garantiu o presidente Temer em declaração ao povo brasileiro no início do mandato.

Mas, o tal “corte na carne”, se existe, definitivamente não atinge o setor público como um todo. Enquanto alguns órgãos (e seus decorrentes serviços) são simplesmente extintos, a Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) funciona quase como um “dreno” de verba pública. Fora as altas cifras despendidas na Casa, a própria produção legislativa do órgão é extremamente baixa.

Criada em 1986, a CLDF só recebeu representantes do povo brasiliense a partir de 1990. Devido à diferente situação jurídica do Distrito Federal em relação aos outros estados (o DF acumula em uma única administração funções de estado e município), a Casa funciona como um misto de Assembleia Legislativa e Câmara municipal. São 24 distritais legislando para os quase 3 milhões de habitantes do DF, divididos em 31 regiões administrativas diferentes.

O orçamento total da Casa chega a quase R$ 556 milhões em 2017. O montante é maior do que o orçamento total de 97% dos municípios brasileiros.

Segundo o demonstrativo de pessoal da CLDF, expedido em junho deste ano, existem mais funcionários em cargos de comissão que servidores efetivos. São 1150 comissionados contra 1056 efetivos, dado que ilustra bem o peso das indicações políticas no bolso do contribuinte brasiliense.

O segundo maior gasto do parlamento brasiliense, fora o pagamento de pessoal, é com propaganda institucional. Por anúncios em outdoors, revistas, sites e blogs, foram gastos mais de R$ 26 milhões em 2016.

Deputados mais caros do país

Os deputados distritais batem recordes de gastos entre todas as Assembleias Legislativas do país. Custam mais, inclusive, que os próprios deputados federais. No caso dos representantes de seus estados no Congresso Nacional, o teto da verba de gabinete (destinada à contratação de assessores) é de R$ 92 mil. Já no DF, chega a R$184 mil, o dobro do valor – o maior montante de todo o país.

Há ainda a verba indenizatória – destinada a custos como combustível, divulgação da atividade parlamentar, manutenção de escritório político, entre outros. O teto da verba é equivalente aos vencimentos dos distritais: R$ 25,3 mil. Apesar de vários estados terem abolido o benefício, como Espírito Santo, Santa Catarina e Rio de Janeiro, no DF o parlamentar pode ainda acumular os valores por até três meses.

Os “sortudos” que legislam sobre o DF tem ainda à sua disposição um carro oficial, auxílio-alimentação de R$ 1000 e auxílio-creche de R$ 681 para cada filho abaixo de 7 anos. Ao todo, cada distrital pode chegar a custar R$ 230 mil todos os meses.

Em nível federal, não existe a verba indenizatória, que é substituída pelo “cotão”, que varia entre R$ 30,4 mil e R$ 45 mil, de acordo com o estado do parlamentar. Em média, cada deputado federal tem pouco mais de R$ 165 mil por mês para exercer suas atividades. No Congresso Nacional, somente senadores e deputados membros da mesa diretora da Câmara têm direito a carro oficial.

Verba indenizatória

O benefício já foi origem de escândalos e constrangimentos para alguns parlamentares. Em fevereiro deste ano, a deputada distrital Sandra Faraj (SD) foi acusada de uso irregular da verba indenizatória. Segundo a denúncia, Faraj teria fraudado notas fiscais e assinaturas para receber um valor calculado em R$ 142 mil.

A parlamentar foi denunciada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) pelo crime de estelionato majorado. Desde então, algumas regras em relação à verba indenizatória foram implantadas, como a extinção da possibilidade de sacar a verba em dinheiro vivo, entre outros.

Mas, mesmo com os olhares voltados ao problema, exageros continuam sendo claramente cometidos. A grande maioria dos deputados, por exemplo, mesmo tendo um carro oficial disponível, alugam um outro veículo com a verba indenizatória. Em um território pequeno como o do DF, onde a Região Administrativa mais longe da CLDF fica a 50 km da Casa, o gasto com transportes dos parlamentares brasilienses chega a valores altíssimos.

O deputado Juarezão (PSB-DF) é um bom exemplo do exagero no gasto do dinheiro público. O parlamentar, não satisfeito com o carro oficial disponibilizado a ele, aluga uma pick-up cabine dupla pela “bagatela” de R$ 6,4 mil todos os meses. De janeiro a junho deste ano, Juarezão pediu mais de R$ 15 mil a título de indenização por quase 4300 litros de combustível que sua “potente máquina” alugada teria consumido. É verdade que o parlamentar tem sua base eleitoral em Brazlândia, que fica a cerca de 45 km da CLDF, mas com essa quantidade de diesel, o deputado poderia ter rodado pelo menos 44 mil km no período. Apenas nos seis primeiros meses de 2017, a “caravana Juarezão” poderia ter dado uma volta completa na Terra, e ainda sobrariam 4 mil km.

Retorno à sociedade

O maior problema, no entanto, não reside no excesso de gastos do parlamento brasiliense. A função do Legislativo em um sistema de estado tripartite é de elaborar leis e de fiscalizar o Executivo. Analisando a partir deste prisma, a situação não melhora muito para a imagem da CLDF.

Quando se fala de produção legislativa, um importante dado recentemente divulgado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) se mostra alarmante. Segundo o tribunal, 77% de toda e qualquer legislação aprovada pela CLDF nos últimos 7 anos foi declarada inconstitucional pelo TJDFT ou pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Em recente declaração à imprensa, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Casa, deputado Reginaldo Veras (PDT), tentou explicar por que tantas leis da CLDF são anuladas pela Justiça. “A nossa Casa é uma Casa política, e não jurídica. E, muitas vezes, os parlamentares, mesmo tendo dúvida da questão da constitucionalidade, preferem levar o projeto de lei adiante para atender a sua base”, explicou.

O procurador-geral de Justiça do Distrito Federal, Leonardo Bessa, defende maior critério na aprovação de matérias pela Casa. “É importante agir de forma preventiva. Aprovar uma lei que mais tarde é questionada pelo TJDFT e declarada inconstitucional representa um gasto desnecessário de recursos físicos e humanos, o que não é bom para a sociedade”, disse ele.

Em nota, o deputado Juarezão garantiu que o uso da verba indenizatória mantém “estrita” relação com a atividade parlamentar e é feito de forma regular, dentro das regras estabelecidas pela CLDF. “Para desempenhar as atividades parlamentares, tenho que me deslocar de Brazlândia para o plano piloto todos os dias e, às vezes, mais de uma vez ao dia, entre visitas à área rural e a cidades do entorno, audiências junto aos órgãos do governo, e participação nas sessões plenárias e nas reuniões de Comissões da CLDF. Aliás, participo assiduamente das sessões da Câmara Legislativa, tanto no plenário, quanto nas comissões de que sou membro. O trabalho exige que estejamos presentes e próximos da população, seja em Brazlândia, seja na Câmara Distrital, seja no Distrito Federal como um todo”, disse.

 

 

 

 

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